Minha foto
Advogado, pós-graduando em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp e empresário em Comércio Exterior.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Juridicidade do ITCMD Progressivo.

Localiza-se o presente estudo acerca da juridicidade do ITCMD Progressivo dentro do contexto legal e jurisprudencial que informa nosso ordenamento jurídico vigente, mais precisamente atendendo-se ao disposto na Constituição Federal, na Resolução 9/92 e considerando a tendência atual de nossa Corte Maior, o STF.

Nossa ordem jurídica está alicerçada em um sistema normativo. O renomado professor Geraldo Ataliba (1968, p.19), em sua análise do sistema constitucional brasileiro, nos ensina que “o sistema normativo é o conjunto unitário e ordenado de normas, em função de uns tantos princípios fundamentais, reciprocamente harmônicos, coordenados em torno de um fundamento comum”.

O sistema tributário nacional é regido por princípios constitucionalmente elencados, dentro os quais se destacam o princípio republicano, o princípio federativo e o princípio da igualdade. Assim, tais princípios são responsáveis pela sustentabilidade do sistema tributário, e por isso de chegar-se a dizer que desrespeitar um princípio é mais grave que descumprir uma simples norma, pois atingir-se-ia todo o sistema, podendo, inclusive, acarretar em seu desmoronamento.

Dos três princípios acima expostos surge, em matéria tributária, o princípio da capacidade contributiva que, consoante artigo 145, § 1 da CF/88, diz que “sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte”.

Nas palavras do eminente Roque Antônio Carrazza (2005, p. 37), “o princípio da capacidade contributiva hospeda-se nas dobras do princípio da igualdade e ajuda a realizar, no campo tributário, os ideais republicanos. Realmente, é justo e jurídico que quem, em termos econômicos, tem muito pague, proporcionalmente, mais imposto do que quem tem pouco. Quem tem maior riqueza deve, em termos proporcionais, pagar mais imposto do que quem tem menor riqueza. Noutras palavras, deve contribuir mais para a manutenção da coisa pública. As pessoas, pois, devem pagar impostos na proporção dos seus haveres, ou seja, de seus índices de riqueza”.

A efetivação do princípio da capacidade contributiva ocorre através da aplicação de alíquotas progressivas. Somente assim, aqueles que possuem capacidade contributiva maior contribuirão mais, da mesma forma que os que são menos favorecidos contribuirão de forma a se respeitar suas limitações. Portanto, quanto maior a base de cálculo, maiores deverão ser as alíquotas incidentes.

O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, conforme preceitua o artigo 155, inciso I, da CF/88, é de competência exclusiva dos Estados e do Distrito Federal, e incidente sobre bens móveis e imóveis, na transmissão a título gratuito e causa mortis. A CF/88 prevê, ainda, que a fixação de suas alíquotas máximas compete ao Senado Federal (art. 155, § 1º, IV), deixando claro um espaço de discricionariedade do Estado e do Distrito Federal de fixar alíquotas respeitando-se o máximo estabelecido. Em cumprimento a tal determinação foi editada a Resolução 9, de 05.05.1992, que, contrariando o padrão internacional, a necessidade de superar as desigualdades sociais e mesmo a tradição brasileira com esse tributo, o Senado fixou em apenas 8% o limite do imposto.

Além do mais, em que pese a Resolução n.º 9/1992, editada pelo Senado Federal, haver assegurado a aplicabilidade do princípio da progressividade ao ITCMD, neste ponto não pode ser considerada, uma vez que extrapolou a competência trazida pela Constituição Federal, pois esta somente outorgou ao Senado a edição de resolução acerca da fixação da alíquota máxima para o ITCMD.

Mesmo assim, independente de previsão expressa, é plenamente aplicável e constitucional a progressividade às alíquotas do ITCMD, pois ao garantir-se tal aplicação estará se efetivando a vontade constitucional e assegurando os princípios republicano, federativo e, principalmente, da igualdade.

Argumentos contrários à aplicação de alíquotas progressivas ao ITCMD partem do fundamento da não existência de menção expressa à aplicação do princípio da progressividade ao ITCMD na Constituição, demonstrando ser esta uma análise extremamente literal do texto constitucional; e a outro, por tratar-se de imposto real, aos quais não seria possível aplicar o princípio da capacidade contributiva e por conseqüência o da progressividade, pela ausência do elemento pessoal.

Não se pode olvidar que a matéria tributária deve ser analisada dentro de um sistema constitucional, regido por princípios e premissas básicas que permeiam todo o conjunto de regras, não podendo desconsiderar-se um princípio fundamental do sistema tributário nacional simplesmente por ausência de expressa previsão legal. Ademais, a progressividade constitui-se em garantia à efetiva aplicação do princípio da capacidade contributiva, e, portanto, da igualdade.

A progressividade assegura a graduação dos impostos conforme a capacidade econômica do contribuinte, constituindo-se em conseqüente lógico do princípio da igualdade e, portanto, dispensa qualquer previsão expressa. Nessa toada, o que se encontra expresso no texto constitucional é o empenho em se assegurar a igualdade, sendo evidente que uma medida que assegure esta igualdade é repleta de constitucionalidade.

Quanto a ser o ITCMD um tributo real, note-se que o § 1º do art. 145 da CF não veda de modo nenhum a realização do princípio da capacidade contributiva relativamente aos impostos reais. É certo que preconiza tenham os impostos, sempre que possível, caráter pessoal e sejam graduados em função da capacidade econômica do contribuinte, porém, isso não quer dizer que só os impostos de caráter pessoal sejam instrumentos de realização do princípio da capacidade econômica, ou contributiva. Hugo de Brito Machado acertadamente assevera que os impostos reais (que consideram objetivamente a situação material sem levar em conta as condições do indivíduo que se liga a situação) também devem ser informados por este princípio, o qual constitui postulado universal de justiça fiscal.

Já Sacha Calmon Navarro Coelho assegura o caráter pessoal do tributo, afirmando que, além da transmissão de bens e direitos, o ITMCD traz consigo acréscimo ao patrimônio do beneficiário (seja ele herdeiro, legatário ou donatário), e que se não houvesse a tributação sobre a transmissão essa se daria na área do imposto de renda.

Esclarece José Souto Maior Borges que todo imposto traz consigo o caráter real e pessoal, uma vez que o caráter pessoal é indispensável para a constituição de uma relação jurídica tributário, a qual está presente em todos os impostos. Portanto, considera infundada tal classificação dos tributos em reais e pessoais, ante a necessária existência de relação jurídica.

Aliás, esse foi o raciocínio acarreado pelo senhor ministro do STF, o ilustre Eros Grau, que, em RE 562045/RS, salientou que o entendimento de que a progressividade das alíquotas do ITCD é inconstitucional decorre da suposição de que o § 1º do art. 145 da CF a admite exclusivamente para os impostos de caráter pessoal. Afirmou, entretanto, que todos os impostos estão sujeitos ao princípio da capacidade contributiva, mesmo os que não tenham caráter pessoal, e que o que esse dispositivo estabelece é que os impostos, sempre que possível, deverão ter caráter pessoal. Ou seja, a Constituição prescreve como devem ser os impostos, todos eles, e não somente alguns. Assim, todos os impostos, independentemente de sua classificação como de caráter real ou pessoal, podem e devem guardar relação com a capacidade contributiva do sujeito passivo. Aduziu, também, ser possível se aferir a capacidade contributiva do sujeito passivo do ITCD, pois, tratando-se de imposto direto, a sua incidência poderá expressar, em diversas circunstâncias, progressividade ou regressividade direta.

Concluímos afirmando ser não só juridicamente possível uma tributação progressiva do ITCMD como também medida central para o combate à desigualdade no Brasil, que ostenta níveis graves de desequilíbrio sócio-econômico. Visto que a concentração da renda limita as possibilidades de crescimento econômico, gera violência, fragiliza as instituições e compromete o sucesso de políticas públicas.




Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
GREGÓRIO, Adriano Beluci Corrêa Santos. A Juridicidade do ITCMD ProgressivoDisponível em: http://www.ferabeluci.blogspot.com/2010/08/juridicidade-do-itcmd-progressivo.html


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ATALIBA, Geraldo. Sistema Constitucional Tributário Brasileiro. 1ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1968.

CARRAZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 21ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2005.

COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11ª edição. São Paulo: Editora Forense, 2010.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 29ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

Nenhum comentário:

Postar um comentário